Discurso António Pinto Leite

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As minhas primeiras palavras vão para o João Alberto Pinto Basto, para lhe dizer o que sintetiza tudo aquilo que sinto por si e a alegria que tive em trabalhar consigo.

O João Alberto tem um dom, que não é muito comum, de ter um coração ao qual um coração sensível não consegue dizer que não. Espero, quando terminar estas funções, que digam o mesmo de mim. Que fui alguém a quem um coração sensível não sabia dizer que não. Se tiver conseguido, teremos feito aquilo que nos é pedido que é ser agradável a Deus.

Tenho três características que gostaria que todos conhecessem.

A primeira é de ordem prática. Sou um médio empresário. Na nossa sociedade de advogados estão-nos confiadas cerca de 250 pessoas, encontramo-nos entre as 450 maiores organizações empresariais do país. Tenho, assim, uma significativa responsabilidade empresarial e uma responsabilidade, digamos, ajustada à economia que nós somos, uma economia de pequenas e médias empresas.

Uma segunda nota de natureza pessoal: sou um Homem completamente feliz e tenho às vezes medo da felicidade que sinto. Está aqui comigo o recibo, a evidência – esse bocadinho de Nossa Senhora, como eu lhe disse ao fim de 7 dias de namoro – que é a minha querida mulher, a Guida. Temos passado por uma provação recente tremenda! Em rigor, Deus levou-me a mim, a ela e a um dos nossos filhos até ao último abismo e depois deitou-nos a mão com a ajuda incrível da oração e do amor de todos os amigos que se ligaram a nós. Esta experiência avivou aquele medo que às vezes tenho da felicidade que sinto.

Terceira nota: além de ser profundamente feliz, não tenho dúvidas de espírito, nem de coração, de que sou um ser eterno. De lá vim, por aqui estou, para lá vou e acho que todos nós somos isso. Como disse no último congresso, pouco me importa a posteridade interessa-me em absoluto a eternidade.

Gostaria de fazer alguns agradecimentos sentidos nesta hora de passagem de testemunho. Ao João Talone, que deixa a presidência da Assembleia Geral, ao José Luis Ramos Pinheiro, que vai fazer uma falta enorme na nossa Direcção. A todos os patrocinadores, sublinhando que esta Associação não vive sem os patrocinadores, eles dão um apoio que é crítico para aquilo que se tem vindo a fazer. A todos os voluntários, a todos aqueles que têm dado o seu tempo e saber gratuitamente à ACEGE. Faço este agradecimento a todos na pessoa de três empresas que têm tido uma generosidade enorme: a Delloite, a Mckinsey e a Accenture. Também uma palavra para o Jorge Líbano Monteiro e para o Gonçalo Corrêa D´Oliveira: vocês são os dois anjos da guarda de todo este esforço. E uma palavra, que é muito mais que uma palavra de cortesia ou sequer de amizade, para o Pe. Mário Rui. As coisas são diferentes quando o Sr. Padre está presente e isso faz toda a diferença.

Fiquei muito enternecido com a distinção que aqui foi atribuída aos associados com mais de 45 anos de ligação à ACEGE. O nosso aplauso levanta a questão da importância da coerência de uma vida inteira. Como é importante este legado na vida dos outros. Como são importantes as grandes famílias, os grandes pais, as grandes mães, os grandes líderes, que passando, ficam.  

Queria, igualmente, explicar-vos o significado da nova equipa. Desde logo, tem uma linha de continuidade. Esta Associação é feita de todas as gerações, não é feita nem para os mais velhos nem para os mais novos. É de toda a comunidade cristã que lidera empresas. Portanto, há um elemento sequencial que é assegurado pelo Nuno Fernandes Thomaz, pelo Francisco Mello e Castro e por mim próprio, na Direcção, e pelo Jerónimo Espírito Santo, no Conselho Fiscal.

É, também, uma equipa impregnada pelos núcleos que estão em desenvolvimento no país todo.

Pretendemos ainda dar um sinal sobre o papel da mulher. A mulher vai ter um destaque central na ACEGE nos próximos anos. Temos, pela primeira vez, uma mulher na Direcção, a Ana Paula Carvalho, que dirige a Pfizer em Portugal.

Na pessoa do Armindo Monteiro, que foi presidente da ANJE e é actualmente vice-presidente da CIP, pretendemos olhar com especial atenção as redes sociais empresariais. É, igualmente, importante, nesta fase em que a ACEGE se está a expandir para o país e para as pequenas e médias empresas, ter na Direcção o João de Mello, que representa um grande grupo económico, com as suas preocupações e responsabilidades específicas.

Uma palavra, ainda, para o António Horta Osório. A sua presença corresponde a um desígnio: a ACEGE deve ser um sinal para todos os líderes empresariais que estão a deixar Portugal e que estão a procurar a sua realização no estrangeiro. O António prontificou-se com toda a alegria e será o Presidente da Assembleia Geral durante os próximos anos.

Uma última nota para a Teresa Magalhães Crespo Salvador, para o João Pedro Tavares, para o Filipe Simões de Almeida, para o David Zamith e para o Ernesto Vieira, que também passam a integrar os órgãos sociais.

Iniciamos funções com grande motivação. Somos pessoas que trabalham 12 horas por dia, para as quais, em termos racionais, não faz sentido assumir esta tarefa. Mas trabalhamos 18 meses por ano e é este 18º mês que dedicamos à nossa fé que dá sentido aos outros 17.

Queria deixar-vos cinco notas breves sobre o próximo mandato.

Em primeiro lugar, as duas palavras chave do mandato: uma é consolidar e a outra é esperar.

Consolidar, porque, olhando a ACEGE como organização, foram feitas demasiadas coisas em demasiado pouco tempo e é preciso consolidar. Desde os núcleos, ao Fundo Bem Comum, do Projecto Igreja, aos Grupos Cristo na Empresa. Tudo isto está fervilhante e é preciso consolidar estas realidades.

Esperar, porque devemos esperar ordens de Nosso Senhor. Se consolidarmos tudo o que tem vindo a ser feito, já teríamos feito um grande trabalho. Simplesmente, vão acontecer mais coisas, que eu próprio não consigo adivinhar, mas vão acontecer. E estou certo que dentro de três anos estaremos a falar delas com gosto.

Em segundo lugar, continuar a reunir gente boa e a valorizar os líderes empresariais. Tenho encontrado tanta gente de bem por causa da ACEGE, que me impressiona, às vezes, o desalento no mundo dos líderes empresariais. Somos uma comunidade que não se conhece nem tem consciência de si mesma. É preciso valorizar no discurso público o papel dos empresários e dos gestores. Há tanta gente com responsabilidade no mundo das empresas que tem uma vida exemplar, que tem um coração exemplar, que tem uma fragilidade ela própria exemplar, na medida em que permanentemente se confronta a si mesma e procura melhorar. A maior bênção que talvez tenha recebido nestes últimos três anos foi, precisamente, a quantidade de gente boa que encontrei por todo o lado.

Em terceiro lugar, a responsabilidade social nas empresas. As nossas grandes empresas, podemos dizê-lo, estão alinhadas com as boas práticas internacionais em termos de responsabilidade social. O grande desafio que está neste momento em cima da mesa é levar a semente da responsabilidade social às micro, às pequenas e às médias empresas. E neste contexto quero dizer a todos os representantes dos núcleos, que vieram de todo o país e estão aqui na sala, que é preciso ter uma grande paixão e disciplina no cumprimento deste desígnio. E digo-vos: se abrirem o vosso coração e derem o vosso exemplo, tenham sempre presente que quando pensarem que nada está a acontecer, algo está a acontecer e disso irão ter notícia mais à frente.

No âmbito da responsabilidade social, a ACEGE deverá ter uma atitude de grande sensibilidade, até porque este mandato corre a par do Pacto de Estabilidade e Crescimento. Vai portanto correr num tempo de sofrimento social. Por isso, a ACEGE e os líderes empresariais cristãos deverão ter presente os que mais sofrem, sobretudo os desempregados e os dois milhões de pobres que confrontam todos os dias a nossa consciência.

Em quarto lugar, o aprofundar da ética cristã. A ética cristã não se confunde com seriedade. A ética cristã vai bem mais longe. A raiz da ética cristã é o amor e por isso implica mais do que ser sério, mais do que ser competente e íntegro.

Os três pilares da ética cristã são a responsabilidade, a integridade e a generosidade.

A responsabilidade porque ela tem uma amplitude útil perante a nossa consciência, vai da obrigação de desenvolver a nossa competência e os nossos talentos ­ – desde logo o talento de saber correr riscos – ao dever de ser prudente. A par da responsabilidade, a integridade. Sentimos há pouco uma alegria enorme com estes nossos associados com mais de 45 anos de compromisso com a ACEGE: caminharam todos os dias nas suas empresas e sentiram, certamente, o silêncio de confiança dos seus colaboradores, dizendo vai ali um homem sério. Esse exemplo une as empresas no sentido mais profundo, dá esperança às pessoas, leva-as a ser mais felizes.

Mas a ética cristã apenas se completa e se realiza com a generosidade. Os empresários e os gestores cristãos, e mais os empresários porque são os donos do negócio, devem cruzar as suas decisões com a generosidade. Porque é possível. Porque dirigir uma empresa com obsessão do lucro, como alertou o Papa Bento XVI, afasta-nos da ética empresarial cristã. Não podemos largar este pilar da ética cristã sem o qual, julgo, nada faz sentido.

Mais: o critério evangélico de amor ao próximo é o melhor critério para uma gestão ética das empresas. Significa tratar o outro como gostaríamos de ser tratados se estivéssemos no lugar dele. É assim que um responsável empresarial deve olhar para um trabalhador, é assim que deve olhar para um accionista, ou para um fornecedor ou para a comunidade que o envolve. O critério do amor ao próximo é um critério nuclear e extraordinariamente eficaz para uma gestão empresarial cristã.

Em último lugar, deve acompanhar-nos nos próximos anos o amor à Igreja. A Igreja Católica, insisto neste ponto, é a maior história de amor que Portugal tem. Não tem nenhuma outra igual nem comparável. É uma história que está no terreno e no quotidiano. É uma história feita por milhares de homens e mulheres. Que envolve os nossos sacerdotes, as nossa Irmãs e dezenas de milhares de voluntários. A Igreja Católica é o maior empreendedor social português.

Temos que amar a Igreja e a melhor forma é disponibilizarmo-nos para ajudar a Igreja a organizar-se. Porque o nosso talento é organizar e potenciar. Se a Igreja quiser, tem-nos à sua disposição. Já fizemos nestes últimos anos um trabalho de grande valia, com a ajuda da Mckinsey e da Delloite. Certamente, em breve, vamos poder ajudar mais os nossos párocos, os nossos bispos, a Conferência Episcopal.

Somos muitos, muita gente boa. Se crescer esta noção de rede, esta noção de conjunto, esta noção de um corpo que está na sociedade com vocação e capacidade para o bem comum, talvez possamos ousar ter um sonho, o sonho de marcarmos decisivamente as lideranças empresariais em Portugal e, no fim do dia, ouvir dizer àqueles que dependem dos líderes empresariais, acreditamos e confiamos em vocês!