Colaboradores Responsabilizados = Colaboradores Motivados

1971
Jorge Líbano Monteiro é secretário-geral da ACEGE

A importância da responsabilização dos gestores para a produtividade foi o tema do debate que a ACEGE realizou no passado dia 9 de Maio, nas instalações da Associação Comercial de Lisboa. Tratou-se de mais um debate de preparação, à semelhança do que discutiu no passado dia 5 de Maio o tema da inovação e da eficiência na gestão, para o XXII Congresso Mundial da UNIAPAC, que este ano tem lugar pela primeira vez em Portugal. É já nos próximos dias 25 a 27 de Maio que a ACEGE acolhe as suas congéneres mundiais em Lisboa, no Centro Cultural de Belém.

Pierre Debourdeau, membro da ACEGE e director-geral do Eurogroup Consulting, moderou o debate em que participaram Eduardo Igrejas, director geral do Grupo Auchan Portugal, Isabel Moisés, directora-geral de Recursos Humanos e Comunicação da Central de Cervejas, e Diogo da Silveira, presidente da Comissão Executiva da Oni. Três representantes de topo do universo empresarial, três histórias de sucesso no âmbito da responsabilização dos colaboradores, três formas distintas de alcançar os objectivos traçados.

O núcleo da questão, na opinião de Eduardo Igrejas, é “o tipo de relação que cada gestor consegue estabelecer com a sua direcção e aqueles com todos os trabalhadores da empresa com vista a obter resultados”. O que, numa empresa com 6500 colaboradores, é condição fundamental para o sucesso.

A Auchan detém hoje em Portugal 17 lojas, num total de 112 mil metros quadrados de área de vendas, de norte a sul e de leste a oeste do País. Com um volume de vendas de 1150 milhões de euros, o grupo tem vindo a crescer a um ritmo consolidado ano após ano. Resultados, como salientou Eduardo Igrejas, “que se atingem com a força de trabalho”.

Entre 2000 e 2005 ingressaram mais 1200 colaboradores no grupo, que hoje conta com um total de 6500 funcionários. Trata-se de uma empresa jovem – a idade média dos colaboradores é de 30 anos – e que fomenta a ocupação de cargos directivos por mulheres. Como explicou Eduardo Igrejas, numa actividade em que “80 por cento dos clientes são mulheres, é fundamental ter mulheres à frente da equipa”.

Mas a Auchan está também à frente no que se refere à integração de deficientes na força de trabalho, contando actualmente com 30 colaboradores nestas condições, face a uma previsão de uma centena em 2010. Neste parâmetro, a empresa lidera no seu sector de actividade. Não será talvez por acaso que a companhia ganhou já por três vezes o Prémio de Excelência atribuído pelo Ministério do Trabalho.

Colaboradores da Auchan têm 17 % do capital

A cultura da Auchan, explicou Eduardo Igrejas, está alicerçada em três eixos, a saber: a partilha do saber; a partilha do poder; e a partilha do haver.

Partilhar o saber é essencial, na medida em que a Auchan “é um grupo familiar, com mais de 40 anos de actividade e um dos principais na Europa, não cotado em bolsa”. Em 2005, registaram-se mais de 170 mil horas de formação e 93 por cento dos colaboradores tiveram mais de uma acção de formação ao longo do ano. A média de horas de formação por colaborador situa-se em 27.

Formação que depois se reflecte nos resultados. Um exemplo prático: em todas as lojas, diariamente, antes da abertura, os colaboradores fazem o ponto da situação sobre as vendas do dia anterior e verificam que objectivos foram atingidos. Como sublinhou Eduardo Igrejas, este é um passo “essencial para a motivação do dia de trabalho”. Semanalmente há uma reunião do Comité de Direcção de Loja, em que se avançam ideias de melhoria sobre programas em análise. “A escuta ao colaborador no terreno é fundamental”, salientou Eduardo Igrejas. As sugestões são imediatamente analisadas e postas em marcha. O sistema interno de comunicação encarrega-se depois de propagar aquelas (boas) práticas por todas as lojas.

Quanto à partilha do poder, Eduardo Igrejas sublinhou que 70 por cento dos quadros iniciaram a carreira pela base. O próprio ingressou na cadeia num pequeno supermercado Pão de Açúcar, aos 22 anos e, como hoje reconhece, “aprendi muito”. Aliás, acrescentou, “90 por cento do Comité de Direcção, composto por nove pessoas, fizeram este percurso”, ou seja, oito pessoas. O que, na opinião do director-geral da Auchan, “potencia esta nossa cultura da iniciativa e da responsabilização”. É assim, esclareceu, que despontam “os mais preparados, os mais corajosos, os mais sérios”.

A partilha do haver, finalmente, expressa-se em números como o seguinte: 17 por cento do capital pertence aos colaboradores. Praticamente a totalidade – 98% – dos colaboradores da Auchan Portugal são accionistas da empresa, situando-se o património médio de cada colaborador em 2500 euros.

“Remunerar bem pode ser difícil mas não é complicado”, referiu o director-geral da Auchan. Não deixa, no entanto, de ser uma tarefa exigente. O último passo que a Auchan pretende dar no âmbito da partilha do haver, ainda este ano, é “partilhar também uma parte dos lucros com os colaboradores”, anunciou.

O que falta, então? “Que todos nós, no futuro, consigamos trazer paixão”, avançou Eduardo Igrejas, para quem o comércio é “paixão, coragem, arriscar, ser humilde”, mas também “saber dizer não”, algo por que luta bastante, conforme afirmou. Falta, assim, contrariar a noção instituída entre os colaboradores que têm de dizer sempre que sim.

A finalizar, Eduardo Igrejas assinalou a necessidade de criar condições “para que todos os colaboradores possam liderar a empresa, tanto em Portugal como no estrangeiro”. Conforme revelou, os colaboradores portugueses são “fortemente solicitados para exportarem capital humano”.

Formação na Central de Cervejas passou de 17 para 40 horas por colaborador

Uma história diferente para contar tinha Isabel Moisés, que concordou que a paixão é fundamental, já que “é o que permite ultrapassar o que já foi obtido e aumentar a satisfação”.

A história da Central de Cervejas neste campo “está a começar”, salientou a responsável da empresa. Duas marcas que são “património nacional” – Sagres e Luso – encontravam-se há três anos numa posição de “não paixão”. Ou seja, “competiam no mercado sem a alma da paixão, que permite acreditar que se pode ir mais longe”, explicou Isabel Moisés. E os resultados para todos os envolvidos podem ser melhorados desde que tenham esta crença enraizada.

Os passos seguidos na abordagem à mudança foram os seguintes: anunciar a todos os envolvidos a visão da empresa, facultar os instrumentos para que todos se preparassem e participassem, com muita ambição, e instituir níveis de recompensa para todos.

Ao longo da caminhada que foi o processo de mudança na empresa, um aspecto sempre muito crítico, sublinhou Isabel Moisés, é o de ”balancear o resultado de curto prazo e o de longo prazo”. Insere-se também nesta perspectiva o balanceamento entre as qualificações e as competências dos colaboradores. Os frutos estão à vista: para 2006 o investimento em formação tem o objectivo de 40 horas por colaborador, num total de mil, face a um anterior patamar de 17 horas.

E, “no meio de todas estas decisões, saltou para a mesa a das competências e capacidades na gestão”. Como explicou Isabel Moisés, “todos os nossos gestores têm uma preparação académica que vai dos cinco aos três anos, dentro de uma determinada área científica”. Mas nenhum teve preparação para a gestão das pessoas e a liderança, uma área dramática, considera Isabel Moisés, “porque é onde se interage”. O que explica que os líderes de sucesso sejam eficientes nesta matéria.

Oni quer dar a volta por cima com PME e clientes residenciais

Como é público, as contas da Oni não se encontram na sua melhor forma, razão pela qual Diogo da Silveira preferiu salientar algumas boas práticas recentemente implementadas.

Como esclareceu, a Oni era um projecto muito grande, que pretendia, nomeadamente, ser a alternativa à Portugal Telecom. Mas o mercado não o permitiu e a situação deteriorou-se. Diogo da Silveira encontra-se há um ano na empresa, que apresenta actualmente os seguintes números: uma facturação de 170 milhões de euros; resultados negativos superiores a 50 milhões de euros; e uma dívida no balanço de mais de 700 milhões de euros.

Obviamente que o estado dos colaboradores era de desmotivação. Tentou-se então lançar um projecto de inversão da tendência cujo objectivo era o de recuperar a empresa, com as mesmas pessoas. “Não mudou um só administrador, talvez somente um ou dois directores”, fez questão de esclarecer Diogo da Silveira.

Desta forma, responsabilizaram-se os colaboradores, motivando-os para as três prioridades estabelecidas: “Crescer; crescer; e crescer”, como sublinhou Diogo da Silveira.

O projecto arrancou há um ano e, portanto, não gerou ainda mudanças significativas. Mas já foram postas em prática algumas medidas de base. Uma das primeiras foi a venda da operação em Espanha, o que permitiu reduzir a dívida de 730 para 300 milhões no espaço de um ano.

Outro objectivo estabelecido foi o de fazer crescer a empresa sobretudo no segmento de retalho. A Oni sempre teve uma posição muito forte nas empresas, “com uma quota de 21 por cento no mercado das grandes empresas portuguesas”, referiu Diogo da Silveira. A estratégia de conquista de clientes no sector de retalho, que engloba as PME e os clientes residenciais, parece estar a resultar: desde há um ano a empresa tem angariado 2000 clientes por mês. O “Oni Duo”, que foi relançado, capta neste momento o triplo de clientes por mês (6000). Como explicou, na mente dos consumidores, “desistir da PT não é fácil”, até “porque a própria PT não facilita”. Anteriormente, os clientes residenciais demoravam cerca de 95 dias a mudar de operador. “Hoje demoram 27 dias, o que continua a ser um exagero”, opinou, mas o objectivo é reduzir ainda mais este prazo.

Um processo que tem sido efectuado “sempre com as mesmas pessoas”, sublinhou o presidente da Comissão Executiva da Oni, e sempre em torno da “ideia da responsabilização”

Reflexões Sobre a responsabilização acompanhada de prémios

“Houve algumas recompensas, simbólicas, porque não temos lucros para distribuir”, Diogo da Silveira.

Sobre a exportação de capital humano da Auchan Portugal

“Na questão da língua, o país mais complicado é a Polónia. No nosso plano de formação aprender polaco leva um ano e meio, ao passo que línguas como o francês ou o inglês levam 15 dias a um mês”, Eduardo Igrejas

Sobre a atitude   

“A atitude, a paixão, é fundamental.

 A maior parte das pessoas surpreendem-nos se lhes dermos condições adequadas e confiança”, Isabel Moisés

Sobre a humildade no exercício da autoridade.

“Hoje um quadro, mesmo em início de carreira, não está para aturar o exercício da autoridade de alguém que não demonstra o porquê das coisas. O importante é saber que há alguém acima que tenta ensinar como se faz”, Eduardo Igrejas

”Para interagir e não se isolar, qualquer pessoa tem de ter uma postura humilde”, Isabel Moisés

“Se juntarmos a confiança à humildade, isso vai permitir ouvir e escutar, a principal qualidade da liderança”, Diogo da Silveira.