Certinho ou irreverente?

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Cinco anos depois de ser idealizado como um projecto editorial para preencher uma lacuna na análise das questões da Ética e da Responsabilidade Social em Portugal, o VER consagra o seu pequeno mas importante papel no panorama da gestão responsável. E multiplica-se em projectos que visam alargar a sua comunidade e aprofundar o debate. Mesmo sem gerar consenso – certinho para uns, irreverente para outros -, o VER não perdeu nunca o sinal que o marcaria à nascença: ir mais fundo na análise, tratando os temas com a originalidade de um outro olhar
POR GABRIELA COSTA

Assinalando cinco anos de existência, o Portal VER realizou no seu dia de aniversário, 22 de Novembro, em Lisboa, um Encontro com Parceiros. O evento, que teve como objectivo central reunir todos aqueles que ao longo deste tempo contribuíram para o crescimento do projecto, foi dinamizado através de um pequeno-almoço informal que constituiu um espaço de sinergias e troca de ideias, a propósito da gestão responsável.

Continuar a perseguir o objectivo de dar a conhecer as práticas que, nacional e internacionalmente, colocam as organizações no mapa de um mundo mais ético e responsável é o desígnio do VER, meia década depois do seu nascimento.

Nesse sentido, e como sublinhou a editora executiva do VER, Helena Oliveira, “se realmente existe algo que merece ser comemorado, é o facto de, ao contrário do que acontece em muitos sectores da vida deste pais, termos conseguido reunir um conjunto representativo de parceiros que, ao longo destes cinco anos, esteve sempre ligado ao crescimento do VER”. Para Helena Oliveira, reunir na mesma sala líderes empresariais e do Terceiro sector, consultores e académicos é “uma enorme vitória ou, em dia de aniversário, um presente com muito conteúdo”.

Ora, conteúdos especializados sobre Valores, Ética, e Responsabilidade Social, tratados com a profundidade necessária para ‘olhar o mundo das empresas com outros olhos’, foi o que motivou a criação deste projecto, como explicou Nuno Brito, gestor na EDP e um dos principais mentores do mesmo: “a história do VER nasce quando morre o Portal Executivo. Na altura já colaborávamos com a ACEGE e, em conjunto com outros parceiros, como a Accenture, avançámos com o desenvolvimento desta iniciativa, que nos permitia ter um espaço editorial na área da responsabilidade social. Cinco anos depois, discutimos hoje o futuro, e o que pode ser feito, em colaboração com os nossos parceiros”.

Desde sempre o Portal “pretendeu ser uma plataforma que reunisse os temas que um conjunto de empresas e organizações queriam desenvolver nestas áreas”. O VER é por isso, e sempre foi, “um Portal de todos”, sublinha também Jorge Líbano Monteiro, director do Portal. Nas boas-vindas aos parceiros, o director do VER recorda a “intuição inicial que tivemos, de que existia falta de espaço para abordar as questões da ética e da responsabilidade. Hoje, essa intuição está mais que confirmada”, conclui.

Preencher uma lacuna
A 20 de Novembro de 2008 era oficialmente lançado, em Lisboa, o VER – Valores, Ética e Responsabilidade. A equipa inicial já trabalhava no projecto desde 2007, e as primeiras formas gráficas evoluíram para a cor azul e para linhas mais depuradas, até ao salto, em Setembro de 2010, para a versão 2.0, que, em parceria com a Microsoft, permitiu melhorar a imagem do Portal e introduzir uma série de novas funcionalidades.

Ao longo desse percurso, o VER esteve acompanhado por um conjunto de parceiros a quem Jorge Líbano Monteiro prestou agradecimento: “aos patrocinadores, porque possibilitaram que o Portal avançasse, aos parceiros académicos e do Terceiro sector porque vêm trabalhando connosco de uma forma muito presente, o que para nós é essencial”, e aos media, porque são importantes para lançar para fora a mensagem.

A análise dos principais temas da actualidade relacionados com gestão ética, liderança responsável, inovação, sustentabilidade e cidadania é o que o Portal oferece aos leitores em permanência, difundindo semanalmente a sua newsletter com os principais conteúdos do momento: cinco artigos que são também disponibilizados pelos parceiros de media do VER, o Jornal de Negócios online, na categoria “Gestão Responsável”, e a Rádio Renascença, no Página 1. A este respeito, e “a título de curiosidade, em 2011, e no top dos artigos mais lidos no Negócios online, um era nosso”, diz Líbano Monteiro.

Ainda no que toca a colaborações com outros órgãos de comunicação, o VER tem “uma importante presença na imprensa escrita” desde Setembro de 2008, desenvolvendo o suplemento mensal OJE Mais Responsável no jornal económico OJE.

Essencial, para dar eco às tendências internacionais é o Revistas em Revista, um produto que passa a quinzena em revista através dos resumos dos mais importantes artigos de publicações como a Harvard Business Review, a The Economist ou a Fast Company que, se perdeu ritmo na sua periodicidade, irá ser retomado brevemente, garantiu Jorge Líbano Monteiro.

Por cá, o Portal associa-se, “sempre que possível”, à divulgação e cobertura jornalística de eventos e iniciativas. E desenvolve pontualmente formatos de conteúdos à medida para empresas, na área da RS, para além de uma área de Serviços Especiais que se estende do desenho da imagem corporativa ao desenvolvimento de Websites ou à consultoria de comunicação empresarial, e que “permite ao VER viver através da prestação de serviços”.

O VER em números
No seu inquérito geral de 2012, realizado ao universo de leitores do VER entre os dias 8 e 27 de Novembro, o Portal reúne os principais factos da sua realidade actual, em números. O VER regista hoje mais de 587 mil visitas (incluindo do Brasil, Espanha, Reino Unido, EUA, Angola e Alemanha, tendo um portfolio de mais de 1500 artigos e mais de 220 newsletters).

Das 446 respostas obtidas em apenas 15 dias, até 21 de Novembro, conclui-se que:
. 60% dos leitores do VER estão nas faixas etárias que se estendem dos 35 aos 54 anos, em idade activa, portanto. Cerca de 45% possuem, em termos de nível de escolaridade, uma pós-graduação, um mestrado ou um doutoramento.

. 90% dos respondentes dizem-se bastante satisfeitos com o site e com a newsletter  – ocupando, numa escala de 0 a 5, as classificações 4 e 5.

. Mais de 180 pessoas afirmam ler, em média, três dos cinco artigos que o VER publica semanalmente. E existe mesmo quem leia os cinco…

. As entrevistas e as opiniões são dois dos formatos preferidos pela comunidade de leitores.

De resto, e dando já resposta à preferência dos leitores, o VER quer promover o debate, reforçando e encetando novas parcerias. “Vamos criar novos espaços, para as consultoras, as universidades e as organizações sociais”, adianta Jorge Líbano Monteiro.

Paralelamente, o VER projecta-se para o futuro e este passa por Angola, onde será lançada, em Janeiro de 2013, uma versão do Portal. Focado na lusofonia, o projecto quer levar as questões da ética e da RS aos países de expressão portuguesa, o que é “um desafio” cujos primeiros resultados já se sentem, através do programa de formação para o sector público empresarial que a ACEGE está a desenvolver em Angola com a ACGD, um dos parceiros do VER Angola.

Para o director do Portal, o VER tem pela frente três grandes desafios: afirmar-se como um espaço para o mundo lusófono; fomentar a opinião e o debate através da criação de novos espaços para os parceiros e alargar a sua comunidade.

“O debate é fundamental para o ajustamento dos valores”
Reunidos, em boa parte, os parceiros que permitem ao VER projectar o crescimento dessa comunidade, o dia de aniversário do VER serviu também para, nas instalações do Portal, em Lisboa, lançar o debate. Sob o mote “5 Anos a olhar o mundo das Empresas com outros olhos”, a Editora executiva do VER moderou uma mesa redonda que teve o mérito de reunir 15 responsáveis de empresas, organizações sociais, consultoras e meio académico. Agradecendo a todos por “mais do que serem parceiros do VER, serem parte integrante do projecto”, Helena Oliveira sublinhou os contributos dados e lançou o repto para que cada um, na sua área de especialidade, ajude agora o Portal a tomar o pulso dos temas que serão de tratamento jornalístico obrigatório, na sua próxima etapa.

Nuno Fernandes Thomaz, homem “que toca vários instrumentos”, como sugeriu a editora, abriu a discussão, considerando que o debate dos valores da ética no mundo empresarial é fundamental, num período extremamente difícil de ajustamento, “que não ficará só pelo dois ou três anos e que não é apenas de ajustamento financeiro, mas também dos valores e das formas de estar na sociedade”. Como disse um dia o professor catedrático da AESE – Escola de Direcção e Negócios, Raúl Diniz, “temos que regenerar a ética”, lembrou então Helena Oliveira.

© VER

E como existe sempre “a oportunidade de retirar aprendizagens” em todos os processos de mudança, o vice-presidente da ACEGE sugeriu que o Portal acompanhasse com mais debate os tempos que se vivem: “foi sempre uma luta minha, dentro do VER, promover a realização de um frente-a-frente com entrevistas a dois líderes, opositores nas ideias que defendem”. O confronto é sempre feito pelas mesmas pessoas, vivemos em circuito fechado”, lamenta. Defendendo que é necessário “dar voz aos mais jovens e a pessoas capazes com pouca visibilidade”, Nuno Fernandes Thomaz considerou que a Opinião, no Portal, “está uniformizada”, não gerando “divergências”.

Quais são, pois, os temas que deveriam ser mais tratados na imprensa? Que questões relacionadas com liderança e ética precisam as empresas de ver debatidas na agenda? À questão da editora executiva do Portal, Pedro Rocha Matos, Partner da Heidrick&Struggles, responde prontamente: “sendo um leitor ávido da imprensa nacional e internacional, o que gosto no VER é que nos permite perceber como estamos globalmente”. A Portugal (às empresas, às pessoas) “falta orgulho”, diz. Orgulho “no que somos, para percebermos quais são as nossas forças e as nossas fraquezas e sabermos valorizar o que de bom temos na nossa economia, como a economia do Mar. Essa análise “não se encontra facilmente”, conclui Rocha Matos e nesse aspecto, “o VER é diferenciador e traz mais-valias, embora possa explorar mais esta vertente”.

Considerando que está na altura de “abanar as pessoas para mudar mentalidades”, o Partner da consultora especializada em executive search defendeu que “o VER permite que tenhamos uma rede de pessoas das várias gerações” capazes de fazer essa mudança. Concordando com o necessário confronto entre opiniões, Luís Garcez, director de marketing e comunicação da Somague, considerou que o VER é um projecto “muito certinho”.

Jorge Líbano Monteiro estendeu então o convite a todos os parceiros presentes neste Encontro informal para que remetam as suas opiniões para o Portal, “com mais frontalidade”.

Conceição Zagalo retomou a questão do debate, afirmando: “confesso que o modelo ‘prós e contras’ me irrita imenso. Ter uns do lado e outros do outro, sem poderem trocar de posição, é algo que comporta vícios de funcionamento”. A presidente do GRACE – Grupo de Reflexão e Apoio à Cidadania Empresarial concorda com a importância que detêm “os futuros líderes”, acreditando que é preciso “pegar nas gerações e confrontá-las”. Confrontada a serenidade dos seniores com a irreverência dos mais novos, podem ter de acontecer “alguns exercícios de humildade para aprender com os jovens promissores”, ironiza.

Quanto a temas, as questões das remunerações, dos impostos e da fuga fiscal são importantes para as empresas, defende o director do VER, ao mesmo tempo que o Portal poderá reflectir mais as questões relacionadas com a conciliação família/trabalho, e “a importante ligação da sociedade civil às empresas”, considera Nuno Fernandes Thomaz. Já Margarida Ségard, em representação da Rede RSO.pt, gostaria de ver abordados mais “temas chave, como a questão da internacionalização, ou o papel dos futuros gestores”, em preparação académica. A propósito, a responsável diz que “gostaria muito de ver crescer o Espaço Universidades que o VER anuncia”.

A causa-efeito do Eu e de Nós
Colocando a bitola na RS que as empresas devem ter relativamente aos seus stakeholders, impõem-se as questões: o que estão as PME a fazer, efectivamente, sobre esta matéria? E que desafios enfrentam neste momento?

Crítica, Conceição Zagalo afirma que “o topo das hierarquias já se incomoda se não aparece nestes meandros. Mas depois manda a ‘base’ tratar do assunto. Se (a RS) não estiver na estratégia da empresa, inclua-se, mas sem retirar muitos recursos…” é assim, nesta espécie de faz de conta, que a presidente do GRACE encontra ainda o tecido empresarial português. Por isso diz: “temos de aprender a declinar o verbo na primeira pessoa. Quer seja no singular ou no plural. Eu e nós estamos cá. É uma questão de causa-efeito”.

Efeito também, para perceber quais são as tendências, terá a leitura do VER, diz Zagalo, adiantando que olha muito para o Portal “numa óptica formativa”, de quem procura (e encontra) opinião aprofundada sobre uma matéria”. E assim prosseguiu o debate sobre a Identidade do VER…

Para Nathalie Ballan, partner da Sair da Casca, o VER pode ser um portal de burgueses instalados (pegando numa expressão utilizada anteriormente por um outro parceiro) que aborda temas educados, mas as ideias não são nada instaladas, são antes arrojadas. “Não concordo que o VER não seja disruptivo. O Portal vai buscar artigos de Harvard, por exemplo, e trata temas originais que não vejo tratados em mais lado nenhum”.

Generalizando, a economista Sofia Santos defende que “não é possível ser disruptivo sem deixarmos de ser hipócritas. Todos temos de fazer este exercício”, diz, lembrando que se esta atitude tem as suas consequências, certo é que “a única forma de sermos disruptivos é assumindo a realidade como ela é”.

Já Carolina Coelho, do IES – Instituto de Empreendedorismo Social, considera interessante ter conhecido o VER na sua curta experiência na área do empreendedorismo social que, defende, está mais dinâmica devido ao contexto” que se vive em Portugal. No seu entender, o Portal deve conseguir levar a plataforma e os conteúdos para outras redes de contacto.

Recolhidas as considerações dos presentes naquilo que é a visão das empresas, consultoras e organizações da sociedade civil a respeito das grandes tendências e desafios em matéria de liderança ética e responsável, faltava perceber o que está em cima da mesa hoje, no que respeita à sustentabilidade. Como questiona Helena Oliveira, de que modo estão as escolas de gestão a olhar para estes temas e a incorporá-los nos seus currículos?

Para Sofia Santos, Coordenadora do Sustainability Knowledge Center do ISCTE, é necessário ter presente que “o principal objectivo da sustentabilidade ainda é fazer com que o tema se estude. E discuti-lo não é só analisar a conciliação da gestão de recursos com a ética”, conclui.

Também para o investigador no CIGEST e docente no ISG –Business & Economics School, Nuno de Oliveira, “se não estamos a ensinar sustentabilidade, então estamos a ensinar insustentabilidade”. Para Nuno Oliveira, neste momento “já não existe capital monetário no planeta para pagar todo o valor de todas as dívidas soberanas. Vivemos presos a um paradoxo não resolvível: saímos da economia da geração de riqueza para entrar na economia de gestão da dívida. É o jogo do empurra à escala global”.

Em termos da nossa cidadania política, “estamos presos entre a física clássica e a quântica: na mecânica de Newton predominam as forças da gravitação universal, onde os corpos com menor massa são sempre atraídos para os centros de gravidade mais ‘pesados’; na mecânica quântica, temos o princípio de incerteza de Heisenberg, que nos diz que um electrão pode estar ou não estar onde é previsto que esteja – tudo depende da excitação que recebe para estar ou deixar de estar”, explica o investigador, concluindo: “é um pouco por aí que andam alguns dos nossos decisores, demasiado atraídos por centros de gravidade que podem degenerar em buracos negros e que flutuam face à probabilidade de ter uma determinada posição conforme é mais excitante”.

Considerando que “temos muita dificuldade em ter uma opinião livre, construtiva e cooperativista, pois o mais provável é sermos castigados se esta não for de acordo com os princípios das nossas organizações”, Nuno Oliveira não duvida que “a disrupção real raramente é recompensada”.

Não obstante, termina com uma proposta de acção ousada para o VER: criar um vídeo de dois minutos de ‘campanha’ pela discussão de ideias a partir de vários elementos proponentes  e deixar que sejam as redes sociais a decidir como querem montar um painel de cinco elementos para dinamizar uma tertúlia organizada pelo Portal.

Fazendo o balanço desta conversa informal, no fecho do Encontro, João Pedro Tavares, vice-presidente da Accenture e outro dos mentores do VER, lançou o repto: vamos tentar pôr em prática algumas das boas ideias que daqui saíram hoje”. Lembrando que o desígnio de actuar para uma extensão alargada da língua portuguesa se coloca desde o arranque do projecto, João Pedro Tavares considerou que o VER não é só um portal, é uma comunidade”. E deixa também um desafio, que considera ser óptimo para a “adolescência” do VER: deixar o broadcast e entrar no interact, interagindo mais com as pessoas”.